Primeira parte de um ensaio sobre a possibilidade de vivermos numa simulação. Texto de Mariana Franco da Silva. Revisão de Mariana Antão e João N.S. Almeida. Imagens: fotograma de World on a Wire, 1973, de Rainer Fassbinder.
1. Introdução
Com um foco direcionado na exposição das diferentes possibilidades que podem definir a nossa realidade, este estudo parte de uma posição de dúvida face à questão enunciada, a partir da qual será apresentada a visão de Nick Bostrom, autor do artigo “Are You Living in a Computer Simulation?”, que foi publicado em 2003 pela revista Philosophical Quarterly. Consequentemente, segue-se uma exposição dos dados oferecidos por esse mesmo artigo. Para uma melhor compreensão do tema e da minha posição sobre o mesmo, apresento de seguida uma descrição da opinião de David Chalmers que, em 2003 escreve um artigo denominado de “The Matrix as Metaphysics”, publicado na secção de filosofia do website do filme The Matrix.
Com esta análise, propõe-se não uma resposta final em relação à confirmação dos constituintes da nossa realidade, mas sim um esclarecimento sobre as suas diferentes possibilidades. O objetivo, será compreender quais são as implicações de viver numa simulação, o que por sua vez se conecta diretamente às justificações que uma civilização pós-humana teria para a realizar. Justificações essas que nos levam a definir se esta hipótese é ou não, um cenário cético. Assim, será estabelecida uma ligação entre todos os temas abordados. No final, esclarece-se se seria ou não lógico elaborar um plano de fuga, se chegássemos à conclusão de que vivemos numa realidade simulada.
Na secção 2., “O fruto de uma simulação”, será levantada a dúvida inicial, sobre se devemos ou não ponderar sobre o facto de vivermos numa simulação. No capítulo 3. “Possibilidades de Bostrom: Argumento da Simulação” e nos seus subcapítulos, serão analisadas as possibilidades propostas pelo filósofo em relação à nossa realidade. Consequentemente, serão expostos os “porquês” de uma civilização se interessar na realização de simulações. No capítulo 4. “Penso. Logo, existo?” serão feitas uma série de afirmações sobre se podemos ou não afirmar a nossa própria existência, determinando seguidamente se o cenário apresentado (de realidade simulada) é ou não uma hipótese cética. No capítulo 5. “Plano de Fuga” iremos discutir se é lógico assumir que existe necessidade de escapar, se chegarmos à conclusão de que vivemos numa realidade simulada.
2. O fruto de uma simulação
Desde sempre foram desenvolvidas teorias com o objetivo de definir exactamente qual é a natureza da nossa realidade. Pretenderei, assim, fazer uma análise da conceção de simulação enquanto fundadora do mundo em que vivemos. Para responder à questão em causa, há que partir da noção de que todos podemos estar a ser gerados por uma dimensão de espécie superior a nós; ou seja, de que toda esta realidade pode ser fruto de uma simulação. No entanto, iremos supor que todos os estados mentais presentes possuem ainda veracidade, uma vez que uma realidade simulada não implica necessariamente uma manipulação dos nossos eventos mentais, mas sim do ambiente que nos rodeia. Há que realçar que mesmo quando nos encontramos a sonhar ou a alucinar, os eventos mentais gerados por essas circunstâncias continuam a ser reais; diferem, sim, por serem fruto de algo que não é parte da realidade que os origina. Portanto, iremos discutir a natureza dos objetos da nossa perceção que se encontram presentes nesta realidade.
Toda a nossa natureza experiencial pode ser apenas um resultado de computação: há uma possibilidade de sermos apenas uma pequena parcela de código inserida num órgão computacional de grande capacidade. Logo, há que pensar sobre a noção de que as coisas externas poderão não ser formatadas como pensávamos anteriormente.
O tipo de simulação sobre a qual iremos refletir será um género de modelo artificial que foi gerado de forma a reproduzir procedimentos da realidade. Uma simulação funcionaria com um tipo de algoritmo que rege todo o funcionamento desse mundo próprio. Assim, tudo pareceria exatamente igual ao real ou concreto, a dimensão original e regente, mas o decorrer das coisas encontrar-se-ia determinado por fatores externos e superiores. A possibilidade de que toda a realidade seja produzida por um género de algoritmo computadorizado parece distante e, para muitos, talvez até impossível.
Embora esta realidade nos pareça uma crença sem fundamento, já foi retratada em várias obras de ficção, como, por exemplo no filme Matrix, dos irmãos Wachowsky, ou em O Mundo no Arame, de Fassbinder. Em Matrix, é apresentado um cenário no qual os indivíduos reais são nada mais do que um corpo entubado, conectado a uma outra realidade simulada que é experienciada apenas mentalmente. Resta-nos ainda questionar se, neste cenário, seríamos semelhantes ao protagonista, que no filme é um humano entubado que se encontra a viver dentro deste mundo, ou como os agentes, que são uma porção totalmente virtual dessa simulação e sem terem necessariamente consciência disso.
Posto isto, escrevo com o intuito de explorar a dúvida sobre a nossa realidade, sobre o que esta pode significar e sobre o que a dúvida sobre a realidade pode significar.
Para os efeitos deste estudo, talvez possamos até comparar o tipo de simulação narrada a um comum videojogo. Se porventura a tecnologia fosse avançada o suficiente para criar uma cópia parecida à nossa realidade, será que notaríamos a diferença ao viver numa? Como não existe forma de saber se tal coisa já aconteceu no passado, não é de excluir a hipótese de já estarmos a vivenciá-la. Os sujeitos desta simulação não seriam capazes de identificar e reconhecer a sua posição, pois se não reconhecemos o que estaria fora da simulação (visto que esta é a única realidade que dominamos) como é que poderíamos notar as diferenças? Os sinais de que vivenciamos esse tipo de realidade podem estar bastante presentes na nossa vida, mas não temos métodos de comparação para sermos capazes de os encontrar. Posto isto, é retirada a suposição de que um mundo simulado teria de ser exatamente idêntico a qualquer outro, pois, ao não existir método de comparação, não existe forma alguma de supor como seria um mundo “real”. O que, consequentemente cria uma abertura para que uma simulação deste género não necessitasse de ser tão idêntica ao mundo “original”.
Assim, compreende-se que não existiria necessidade de construir um universo inteiro, nem com tantos detalhes como o mundo “real”. Tal como os cenários que são automaticamente gerados em jogos complexos, um mundo simulado poderia ser bastante simples para a maioria dos indivíduos que se encontrassem dentro dele, e somente parecer complexo para aqueles que o observam mais de perto. Não existe necessidade de simular todos os átomos, por exemplo, somente aqueles que certa entidade (dentro da simulação) decidiu observar de forma minuciosa.
Nós, os frutos ou participantes desta simulação, podemos estar dentro de uma experiência tão imersiva que nunca chegamos efetivamente a aprofundar a natureza da nossa realidade. Será que existe um outro lado que não estamos a ver? Imaginemos que ao acordar, um dia, chegamos à conclusão de que tudo o que conhecemos é uma mera ilusão, imposta por um certo tipo de plataforma computacional. O que cada indivíduo pensava ser a realidade, na verdade é apenas uma simples simulação, uma ilusão complexa, na qual todos vivemos. Não só chegaríamos à conclusão de que estamos a viver numa simulação, mas também de que esta estaria a ser controlada por um sistema que se encontra em contacto direto com a nossa mente.
Alguns são da opinião de que este é o caso, de que o ser humano vive realmente dentro de uma simulação. No entanto, poderemos dar um caráter de controlo às entidades desta simulação (nós), ou estarão estas somente sujeitas aos impulsos programados pelo sistema?
Existe até a possibilidade, um pouco mais exagerada, de que cada indivíduo não seja nada mais que uma personagem quase que fictícia à qual foi dada um percurso de vida, fazendo de nós meras marionetas do destino. Neste cenário, cada um de nós existiria com o objetivo de sustentar uma linha de sucessão de acontecimentos. Assim, este panorama seria percebido como determinista; será este, porém, compatível com o livre-arbítrio? Uma vez que o determinismo implica que todos os acontecimentos se encontrem determinados por causas, daí é retirada a noção de que existe um efeito para cada causa. Há que explicitar que as mesmas causas poderiam resultar em efeitos distintos.
Se a nossa resposta em relação à compatibilidade do determinismo e livre- arbítrio for dada de uma posição incompatibilista, então a conclusão será que não, não existe compatibilidade. Desta posição segue-se a ideia de que não existem possibilidades futuras em aberto, uma vez que os defensores desta visão assumem que o determinismo retira a possibilidade de escolha dos indivíduos, pois as nossas vontades não seriam livres. Portanto, num cenário simulado, incompatibilistas afirmariam que o livre-arbítrio é uma farsa.
Opostamente, existe a posição compatibilista, que assume que o livre-arbítrio é compatível com o determinismo. Nesta visão, as circunstâncias encontram-se ainda determinadas por uma força maior; no entanto, os indivíduos são definidos como livres, na medida em que escolhem de que forma respondem às situações propostas. Portanto, acontece algo análogo a não sermos capazes de escolher quais são as perguntas propostas, mas sermos capazes de escolher quais são as respostas.
De acordo com o progresso tecnológico dos dias de hoje, não é errado pensar que um dia existirá um sistema avançado ao ponto de gerar um tipo de simulação com estas caraterísticas deterministas. O universo que conhecemos poderá ser como uma flor, que cresce dentro dos limites de um vaso. As formatações desta simulação estariam então enraizadas nos sujeitos, que funcionariam unicamente de acordo com os limites que lhes fossem dados. Posto isto, dentro do vaso, talvez possamos escolher as nossas ramificações.
Em teoria, todo o nosso universo poderá ter sido estabelecido por um grande nível de inteligência computadorizada. Portanto, torna-se um pouco mais plausível que todo o nosso universo seja, possivelmente, uma simulação. No entanto, ao falsear algo de forma precisa, será que este algo se torna diferente da coisa em si? Talvez não, mas esse facto apenas será verídico se formos parte de uma simulação idêntica. No entanto, ao não possuirmos capacidade de reconhecer como são as coisas originalmente, não existe forma de saber.
A meu ver, este é um bom ponto de partida para o questionamento que temos pela frente, pois facilmente os nossos sentidos nos poderão enganar e conduzir a uma falsa noção de realidade, que se encontra encoberta por um véu de engano.
A hipótese de estarmos a vivenciar uma realidade minuciosamente formatada acaba por levantar bastantes dilemas filosóficos; no entanto, aparenta resolver alguns, como a questão da criação. Esta teoria, ao ser verídica, explicaria quais são os critérios da existência do ser humano. Poderia, até, desmistificar todo o questionamento em torno do que podemos denominar como real, do que é realmente o ser humano, do que é todo o universo que nos rodeia. Penso que este questionamento é de grande importância.
Por vezes parece que nós, enquanto indivíduos, nos aconchegamos apenas a uma aceitação da realidade que nos é oferecida. Portanto, será esta que nos é oferecida apenas aquela que nos é permitida? Quais são as possibilidades?
3. Possibilidades de Bostrom: Argumento da Simulação
Em 2003, um filósofo da Universidade de Oxford, Nick Bostrom, desenvolveu um argumento no qual nos apresenta três possibilidades sobre a nossa realidade.
Para esta análise, há que realçar que o conhecimento do mundo externo continua a possuir veracidade. Há que referir, principalmente, o facto de existirem computadores com cada vez mais competência. A partir desta noção científica, Bostrom questiona-se sobre quais as capacidades que uma civilização avançada terá, propondo também a hipótese de que esse avanço (viver numa simulação) poderá já ser o nosso presente. Aqui, serão estudadas as implicações desses fatores.
A capacidade computacional de uma civilização avançada seria excessiva. Nick Bostrom, no seu artigo, expressa que no futuro existirá uma vasta disponibilidade tecnológica. Sugere ainda, que uma civilização pós-humana terá a capacidade de realizar aquilo a que chamamos de “simulações de ancestrais” ou seja, simulações tão detalhadas, ao ponto de simularem todos os acontecimentos do nosso universo, desde o Big Bang. Dentro de uma realidade digital de tal dimensão, o universo estaria a ser criado a um nível molecular.
Os habitantes desta realidade seriam portadores de consciência, memórias, emoções e sensações. Essencialmente, os sujeitos deste universo, estariam conscientes da sua existência. No entanto, há que questionar se as entidades presentes (nós) seriam capazes de reconhecer a verdade por detrás da sua própria criação, ou seja, a fundamentação do cosmos.
Um fator que é um pilar fundamental na argumentação de Nick Bostrom é a independência do substrato. Este conceito propõe que estados mentais conscientes podem emergir em estruturas e processos que vão para além das redes neurológicas do cérebro. Tal conceito poderá gerar opiniões controversas: poderão estados mentais emergir de um sistema computacional?
É estimado que a emulação de uma mente humana necessite de no máximo dez a dezassete operações por segundo. Isto significa que uma civilização pós-humana poderia gerar uma recriação da história mental de todos os seres que já viveram até ao presente, utilizando apenas uma pequena porção do seu poder de processamento. Uma vez que, de acordo com Bostrom toda a realidade seria simulada, os estados mentais não seriam o único fator a ser manufaturado, mas também tudo o resto. No entanto, a posição de Bostrom sobre a natureza da nossa simulação não me parece acertada, uma vez que parece mais provável concluirmos que simulações seriam feitas a nível molecular, pois isso implica uma menor manufaturação direta dos constituintes da nossa realidade. Há que realçar que, num panorama onde toda a realidade fosse manufaturada de forma específica e deliberada, haveria uma maior capacidade de manipulação do sistema, pois as suas variáveis possuiriam mais abertura para ser controladas. Num cenário de codificação a nível molecular, parece automaticamente surgir a noção de que apenas o ambiente inicial foi computacionalmente programado, e de que, consequentemente, as coisas existentes apenas surgiram como seguimento desse desabrochar inicial.
Ora, de acordo com Bostrom, é essencial uma preocupação com a quantidade de universos simulados. O filósofo realça que quanto maior for a quantidade de universos simulados, menor será a nossa chance de habitar num universo não simulado. Portanto, se fosse o caso de existirem 9 universos simulados e 1 universo não simulado, e se aleatoriamente fossemos introduzidos num universo, a probabilidade de acertarmos no universo não simulado seria apenas 1 em 10. Há que notar, que quanto maior for o número de civilizações pós-humanas (ou seja, não simuladas) com os meios para executar simulações, maior poderá ser o número de universos simulados. No entanto, este fator depende também da capacidade computacional que essas civilizações teriam, pois quanto maior for essa capacidade, maior é a probabilidade de gerarem mais simulações. Podemos, assim, compreender que a probabilidade de vivenciarmos um universo não simulado parece diminuir, à medida que estas implicações são esclarecidas.
Com o seu artigo, Nick Bostrom tenta demonstrar que no mínimo 1 em 3 preposições é verdadeira. No entanto, não determina qual delas o é, pois atribui uma probabilidade igual para todas as propostas. Ora, as opções são as seguintes: ou 1) civilizações em geral vão ser extintas antes de atingirem um estado pós-humano, ou 2) civilizações pós-humanas não irão realizar simulações, ou 3) estamos a viver numa simulação.
Podemos perguntar-nos: Existe a capacidade para executar simulações?
Existem fatores que impedem que simulações deste calibre venham sequer a existir. Bostrom aponta-nos duas justificações: ou a) nenhuma civilização terá a capacidade de executar simulações; ou b) uma civilização pós-humana não terá interesse em executar simulações, apesar de ter essa capacidade.
A primeira opção sugere que a humanidade não será capaz de alcançar um patamar pós-humano de desenvolvimento. Este cenário poderá dar-se a partir de um género de evento catastrófico, que consequentemente acabaria com toda a raça humana. Logo, tanto a existência das civilizações como a sua evolução encontrar-se-iam para sempre estagnadas. Dois exemplos de catástrofe poderão ser 1) mudanças climáticas que levem sociedades inteiras a colapsar; ou 2) o impacto de um meteoro que acabe com toda a vida no nosso planeta. Esta possibilidade implica que não existe amadurecimento tecnológico suficiente em nenhum ponto da história universal, ao ponto de gerar simulações com tão alto nível de desenvolvimento.
Portanto, ao observar a primeira possibilidade proposta por Bostrom, podemos especular sobre as chances de uma civilização pós-humana não ser capaz de realizar este tipo de simulações. Até que ponto, no entanto, é que parece credível que os avanços tecnológicos da humanidade não atinjam esse patamar? Como já foi mencionado anteriormente, a nossa própria sociedade já se rege por diversos tipos de simulações. Neste preciso momento, um pouco por todo o mundo, realizam-se variadíssimos modelos de simulação. A meu ver, se já existem sistemas capazes de simular situações de tal forma detalhadas (como por exemplo: o Big Bang), não parece acertado concluir que a humanidade nunca será capaz de realizar tais procedimentos. No entanto, talvez esta possibilidade tenha um certo fundamento. Evidentemente, existem cenários que poderiam levar o nosso mundo à extinção, acabando por o impedir de evoluir de forma adequada ou suficientemente rápida.
No entanto, parece bastante improvável esta hipótese a) pois, como já concluímos, o poder de sistemas computacionais cresce rapidamente, o que nos leva a crer que eventualmente será possível realizar simulações deste calibre. Ao observar o desenvolvimento de videojogos nos últimos vinte anos, podemos encontrar um exemplo dessa evolução. Podemos, ainda, notar o desenvolvimento científico em torno de simulações 3D, que ao longo dos tempos se tornam cada vez mais realistas e imersivas. Por fim, pode ainda ser dado o exemplo da simulação de átomos, que é atualmente gerada com grande fidelidade.
Gordon Moore propõe, em 1965, que a quantidade de componentes eletrónicos inserida num circuito computacional dobraria a cada dois anos. Assim se cria a Lei de Moore. Esta acabou por encurtar a sua velocidade ultimamente; no entanto, atualmente a capacidade de processamento continua a aumentar. Nos dias de hoje, existem inclusive realidades virtuais como o jogo The Sims ou até mundos gerados por óculos de realidade virtual. Portanto, a este ritmo supõe-se que em algumas décadas a humanidade estará apta a concluir se é ou não capaz de criar uma simulação com tal complexidade. Com estas evidências, já detemos um fundamento sólido para apontar que provavelmente haverá um certo ponto em que será possível alcançar a habilidade de executar simulações bastante completas. Logo, esse fator não parece possuir qualquer tipo de impedimento.
Há que apontar que seria somente essencial que uma civilização se tornasse tecnologicamente madura e capaz de executar simulações, para que a proposição 1) perdesse o seu valor de verdade. Assim, deixaríamos apenas as hipóteses 2) e 3) com um maior nível de probabilidade. Logo, nos restantes cenários, os artifícios necessários para colocar simulações deste cariz em prática estariam amplamente acessíveis a civilizações avançadas. No entanto, qual seria a utilidade de tal criação?
3.2. Uma criação útil?
Tendo em conta a certeza de que se realizam simulações com vários fins, uma outra dúvida coerente será o porquê deste tipo de cenário ser útil para civilizações futuras (ou já existentes). Tendo em mente que uma simulação funciona de forma a modelar fenómenos da realidade com base em conceitos e fórmulas matemáticas, conclui-se que é essencialmente um programa que permite aos seus utilizadores uma forma de observar os acontecimentos sem que existam consequências.
Este tipo de criação poderia ter vários propósitos, visto que permite simular acontecimentos sem realmente os pôr em prática. Desta forma, uma entidade que se encontrasse em controlo total sobre certo mecanismo poderia prever fiavelmente todos os possíveis resultados. Esta conceção pode parecer um pouco exagerada; no entanto, existe necessidade de a explorar com o intuito de chegar a uma conclusão. Mas talvez esta crença não possua qualquer tipo de fundamento, pois, ao comparar esta ideia com o tipo de simulações que são executadas pela humanidade nos dias de hoje, podemos compreender que os criadores de uma apenas possuem e pretendem o controlo de certas variáveis. O que aconteceria, aqui, seria somente a implementação de um ambiente inicial a partir do qual os seres naturalmente evoluiriam. Portanto, os desfeches dessa simulação poderiam não ser completamente controlados ou manipulados por nenhum tipo de substância. A evolução de uma simulação não se encontraria então manipulada, uma vez que o controlo seria aplicado apenas a certos padrões.
Simulações são utilizadas para calcular ou replicar situações; por norma, a sua finalidade é a de entender e regulamentar as situações do quotidiano, prevendo os possíveis caminhos que uma circunstância pode percorrer. Nos dias de hoje, é gerado um grande número de simulações, sendo muitas destas concebidas em torno de aprimorar sistemas lucrativos. Já possuímos acesso a várias plataformas de cálculo lucrativo. O que acontece dentro desses sistemas é a simulação de inúmeras saídas possíveis, o que aumenta o número de parâmetros na nossa tomada de decisões. Isto faz com que a decisão final seja a mais fiável.
Uma simulação é uma ferramenta utilizada para imitar algo já existente ou proposto. Assim, podemos compreender que tem a capacidade de gerar uma representação visual do código que se encontra inserido. Tal simulação seria um fluir de constante informação, pois iria produzir imitações comportamentais com base em algo externo. Ao fazer alterações nesse sistema, o utilizador externo seria capaz de simplesmente observar como essas afetariam o decorrer das coisas. Ser o operador de tal projeto de criação parece ser algo que o ser humano faria atualmente, se tal fosse exequível. Aliás, já o fazemos, apenas em pequena escala. Ora, jogamos The Sims.
Simular algo pode ser um fator lucrativo, e, como sabemos, o ser humano é um ser ganancioso. Não parece assim tão surreal propor um cenário segundo o qual um dos motivos para este tipo de simulações é monetário. Parece, no entanto, desumano pisar os limites da existência, em prol de receber algo em troca. Mas basta observar o mundo no qual nos inserimos, para compreender que esse é um facto que acontece no quotidiano. O ser humano encontra-se numa busca incessante por controlo. E simulações são detentoras da capacidade de manusear resultados em nosso favor, pois analisam e têm acesso a todas as mudanças e a como estas irão impactar cada aspeto do processo. Uma vez que seja possível simular um universo e observar de que forma os indivíduos se comportam no mesmo, bancos poderão ter interesse nesta simulação, visto que seria possível conceber simulações financeiras bastante fiáveis.
Outro propósito que uma simulação poderia ter é o de entretenimento. Ao controlar uma simulação deste cariz, haveria a capacidade de manipular acontecimentos para nossa própria diversão. Levanta-se aqui outra questão: Se nos encontramos numa simulação, quem a controla apenas interage connosco de forma distante, ou pode também introduzir-se no nosso mundo? Nesta hipótese, talvez o nosso mundo fosse mais palpável e não tão computadorizado; a menos que estejamos a falar de uma simulação constituída por inteligência artificial encaixada num corpo idêntico ao do ser humano. Nesse caso, a interação entre as diferentes realidades teria uma linha mais ténue do que aparenta.
No mundo dos videojogos já observamos simulações a acontecer em tempo real; mas o propósito destes não é apenas o de divertimento. Tal como em qualquer simulação, existe um grande impacto industrial por trás. Na atualidade já podemos ver simuladores em tempo real, como por exemplo simuladores de condução, de centrais nucleares, etc. Nestes casos, as simulações servem para melhorar a resposta física dos seus utentes, em prol de melhorar as suas aptidões. A utilidade fundamental desta ferramenta encontra-se no facto de haver uma grande abertura para agir livremente, sem que se tenha de temer um resultado catastrófico.
Tal como o mundo cinematográfico, que evoluiu com o tempo e deixou de ser unicamente um meio de entretenimento e acabou por ser tornar numa vertente de expressão artística forte, os videojogos parecem estar a seguir esse mesmo percurso.
Este tipo de universo simulado poderia ter propósitos de grande influência na sociedade atual, como, por exemplo, para patentear a cura de certos problemas no campo da medicina. Sabendo que uma simulação é capaz de gerar vários processos em simultâneo, ao tentar curar um paciente, poderiam ser colocados em prova vários tratamentos, apenas com o intuito de descobrir qual é o certo. Parece existir uma certa beleza e utilidade neste tipo de proposta, visto que seria algo benéfico e vantajoso para a sociedade em geral. Mas, se formos nós mesmos os sujeitos dessa experimentação, a opinião modifica-se.
Sistemas de computação suficientemente avançados são capazes de simular reações químicas, condições meteorológicas, circuitos de eletricidade, mecatrónica, reações atómicas, etc. Portanto, até que ponto é que um sistema avançado não teria a capacidade de simular todo um mundo, tal como o nosso? Em teoria, existiria a capacidade de reproduzir todos os processos biológicos, pois todo o tipo de fenómeno que seja possível de reduzir a termos matemáticos pode ser simulado. No entanto, uma simulação deste género seria difícil de obter, pois os fenómenos naturais contêm um grande número de influências. Algo que é utilizado para facilitar a conceção de simulações é a determinação dos fatores que contêm maior importância no que se quer simular. Desta forma, em adição a melhorar os processos comportamentais dentro das mesmas, são gerados impulsos básicos que criam um género de narrativa com a finalidade de atingir um certo objetivo. Sistemas deste cariz têm na sua base conceitos lógicos e matemáticos, acompanhados de relações simbólicas entre as entidades participantes. Ao reproduzir os padrões da consciência humana, seriamos capazes de replicar a mente humana e introduzir esta réplica numa inteligência artificial. A realização de mind uploading poderia ser uma das formas de executar este procedimento. No entanto, será que uma simulação iria conter apenas o fruto de uma inteligência simulada, ou teria no seu núcleo o crescimento de uma consciência real? Esta questão será respondida mais à frente.
Ao existir a capacidade de reprodução fiável das entidades do nosso mundo, poderia existir interesse em imortalizar os seres. Por exemplo, poderia existir forma de imortalizar toda a consciência de um sujeito dentro de algo do tamanho de um chip, que por sua vez se encontraria conectado a um sistema superior. Esta possibilidade de mind uploading supõe que existe capacidade de transferir a mente humana para um ambiente tecnológico, como um computador. Para que este acontecimento fosse possível seria necessário realizar uma examinação do cérebro em prol de retirar detalhes suficientes para captar o seu conteúdo e gerar uma representação artificial fiável. Primeiro, seria necessário reconhecer o que examinar. O cérebro humano é constituído por cerca de 86 biliões de neurónios, que se encontram conectados por sinapses. O padrão de conectividade entre os todos os neurónios cerebrais é denominado de connectome, e este não foi ainda mapeado. Logo, este seria um dos primeiros fatores necessários para que o mind uploading fosse possível.
Existem ainda muitos tipos de conexões ou sinapses, e cada uma funciona de forma diferente. Por exemplo, certos neurónios emitem neurotransmissores que afetam diferentes tipos de outros neurónios, simultaneamente. De modo a mapear uma mente humana, talvez não fosse necessário copiar todos estes procedimentos, apenas os mais relevantes, de forma a retirar um género de código e implementá-lo noutra localidade, como se fosse uma passagem de programas entre computadores. Posto isto, compreende-se que na atualidade ainda não exista forma de executar tal tarefa, pois ainda nos resta compreender e descobrir muitas partes do cérebro e como funcionam as suas interações. Um exemplo são os padrões de atividade entre neurónios, que se calcula que sejam influenciados por um tipo de célula denominada de glia. Esta célula rodeia os neurónios e pode, por vezes, até superar o número de neurónios existentes. Anteriormente, existia a noção de que esta célula existia meramente para apoio estrutural e, hoje em dia, as suas funções ainda não são bem compreendidas. Algumas dessas células (não todas) são capazes de gerar os seus próprios sinais, que por sua vez influenciam o processamento de informação. Assim, compreendemos que o nosso entendimento do cérebro humano ainda não é bom o suficiente para determinar quais são as partes necessárias a examinar em prol de replicar a mente. Mas há que assumir que o nosso conhecimento no futuro irá avançar neste campo, de forma a realizar procedimentos de implantação de consciência. Nick Bostrom, em relação a este tipo de procedimento, afirma que:
‘’Provided a system implements the right sort of computational structures and processes, it can be associated with conscious experiences. It is not an essential property of consciousness that it is implemented on carbon-based biological neural networks inside a cranium: silicon-based processors inside a computer could in principle do the trick as well.’’ BOSTROM (2003)
Um cenário hipotético, onde o ser humano fosse parte de uma simulação, poderia ser fruto de um estudo específico para compreender como várias fórmulas se comportam quando postas em conjunto. Ao tentar desenvolver um tipo de tecnologia que recolha toda a informação de um sujeito e faça com que essa subsista em forma de consciência, acabaríamos por descobrir como juntar todos esses fragmentos de informação num género de colmeia; que, neste caso, seria o nosso mundo, edificado por inúmeros fragmentos de informação. Será que existe impedimento em tal criação?
Os interesses expostos nesta secção possuem importância pois são estes que definem qual seria a natureza de uma simulação. Aqui, foram expostos alguns exemplos; no entanto, nada nos garante que estas fossem as justificações exatas de uma civilização pós-humana. Poderiam existir motivos desconhecidos para a raça humana atual. A importância destas justificações será realçada nos capítulos finais, quando forem expostas questões sobre a natureza de uma simulação e a lógica de escapar de uma.
3.3. Existe impedimento?
A segunda possibilidade do Argumento da Simulação, por sua vez, expressa que uma civilização pós-humana talvez não opte por recriar tais realidades a partir de sistemas altamente capazes. Motivos que poderão tornar esta possibilidade consistente serão as questões de cariz ético e moral, pois, para aqueles que seriam simulados, a dor e o sofrimento (supõe-se, para os efeitos desta justificação) seriam autênticos. Então, parece viável que futuramente haja uma convergência entre as entidades que prosperaram, levando-as a banir tais tipos de simulações. Esta justificação apenas subsiste se uma consciência simulada for tomada como real. Há que realçar que estes fatores se encontram também dependentes das justificações que uma civilização pós- humana teria para realizar simulações, o que consequentemente nos levaria a diferentes hipóteses sobre a sua natureza e constituintes. Por exemplo, certas simulações poderiam nem sequer possuir indivíduos conscientes.
Existe, também, a possibilidade de o valor científico de uma simulação de ancestrais ser dispensável para uma civilização extremamente avançada, devido à sua imensurável superioridade intelectual. A falta de simulações, nesta hipótese, poderia ser simplesmente consequência de uma falta de interesse. Simulações ancestrais, portanto, não existiriam, pois moralmente estas civilizações não achariam correto conceber simulações baseadas nos seus antecessores. Nesta possibilidade, assume-se que os seres inseridos nas mesmas são possuidores de consciência, e assim sendo este fator (a concretização de uma simulação) seria moralmente incorreto, uma vez que iria causar sofrimento nos sujeitos. É implicado igualmente que estas civilizações teriam outros interesses em mente, que não os de criar realidades simuladas.
Contudo, se estas civilizações optarem pelo oposto, e começarem a efetuar simulações de ancestrais, a única opção que nos resta é a mais agitante: a possibilidade de vivermos numa realidade simulada ser quase certamente verídica.
Na minha opinião, não parece credível que não exista nenhuma porção de qualquer civilização inteligente que tenha interesse em executar simulações. Há que notar que não é necessário que toda a civilização tenha o interesse de as executar, mas apenas uma pequena porção. Como foi demonstrado no capítulo anterior, existe uma boa quantidade de motivos pelos quais os seres estariam interessados em fazê-lo.
Mesmo que simulações sejam consideradas imorais, seria apenas necessária a existência de certos indivíduos que não seguissem essas leis morais e possuíssem o interesse de desenvolver estes mecanismos. Ora, suponhamos que existem 20 entidades, das quais 1 possui interesse em realizar simulações. Bastaria um pequeno número para que se tornasse improvável que uma civilização não executasse simulações. E, à medida que esse número (de indivíduos interessados) sobe, a probabilidade de que sejam executadas simulações aumenta também.
Portanto, ao supor a existência desta porção de indivíduos, podemos concluir que é improvável que uma civilização inteira escolha não efetuar simulações. Logo, questões morais ou de proibição não poderão ser tomadas como motivo suficiente para que uma civilização não execute simulações.
3.4. Hipótese da Simulação
Ao apontar que civilizações pós-humanas possuem a aptidão e inclinação de recriar o passado evolutivo dos seus predecessores, dado o contexto de 3), parece lógico que tais civilizações o fariam. Se esta proposição for tomada como verdadeira, podemos estimar que o número total de simulações já realizadas seja muito maior que o número de mundos não simulados. Este fator, consequentemente, insinuaria que nós, enquanto sociedade, não faríamos parte da porção não simulada. Pois, em termos probabilísticos, seria muito mais improvável sermos parte de um panorama não simulado, tendo em conta que o número de realidades simuladas seria maior.
No seu artigo, Bostrom menciona um mundo “inicial” que gera ramificações que, por sua vez, poderão gerar ainda mais mundos. Seguidamente, Bostrom levanta a questão – Em qual dos mundos nos inserimos nós?
O filósofo aponta ainda que não poderão existir infinitas simulações, como talvez alguns erradamente assumam. Essencialmente, ao observar o mundo real, podemos compreender que existe a necessidade de utilizar poder computacional de forma a suportar a existência das suas ramificações. Ao supor que é possível que essas ramificações sejam eventualmente capazes de gerar outras, compreende-se que a potência necessária para suportar todas estas ramificações posteriores acabaria por ser retirada do topo, ou seja, do mundo inicial (criador das primeiras ramificações). Assim, há que concluir que não existiriam números infinitos de simulações, pois o mundo inicial ficaria sobrecarregado em termos de potência, acabando por não gerar suporte suficiente para todas.
Portanto, vamos supor novamente uma situação hipotética na qual existem 9 mundos simulados e 1 mundo não simulado. A probabilidade de fazermos parte do mundo inicial seria somente de 1 em 9. Ao estender este número de ramificações para um número infinito, compreendemos que a chance de viver no mundo “inicial”, seria apenas uma em infinitas. Bostrom, no entanto, afirma que o número de simulações seria gigante, mas nunca infinito, pois tendo em conta a evolução tecnológica de cada uma destas ramificações do mundo inicial, a capacidade de executar cada vez mais simulações iria crescer. Logo, a probabilidade de estarmos a vivenciar um mundo que não é simulado torna-se cada vez mais pequena.
De certa forma, o nosso universo já parece análogo a um computador em alguns pontos da nossa existência. Faremos, mais uma vez, uma comparação a um jogo de computador, no qual existe necessidade de maior processamento devido ao peso do jogo. Ao tentar desenrolar um jogo “pesado” num computador com um software mais antigo, por norma existe a consequência de “travar” o jogo, ou seja, acabamos por observar o seu desenvolvimento de forma fragmentada.
Um género de “arquiteto” de uma simulação poderia ter implementado vários estratagemas de programação com certos padrões, em prol de otimizar o uso do futuro equivalente de memória RAM. Por exemplo, estrelas que se encontram longínquas, estariam a ser projetadas numa baixa resolução, enquanto fenómenos microscópicos se encontrariam preenchidos à medida que são requeridos por um observador. Este tipo de eventualidade, poderá ser semelhante às ocorrências que encontramos no jogo Minecraft. O desenrolar desse mundo e a visibilidade do mesmo, só pode ser observada à medida que o jogador (ou observador) a exige (movimentando-se pelo mapa).
Ainda mencionando a possibilidade 3), podemos supor um panorama onde os seres criadores da nossa simulação, optem por recompensar de forma positiva as condutas que considerem moralmente corretas. Este caso, faria do ser humano, quase como que um simples sujeito de uma experimentação, que seria gerada em prol de analisar os vários tipos de comportamentos humanos.
Em teoria, podemos ainda supor que civilizações simuladas se poderiam também tornar pós-humanas, se lhes fosse dada a contingência de evoluir até esse ponto.
Posto isto, pode-se aqui incluir a opção de a realidade ser composta por várias camadas, ou ramificações do mundo inicial, como já foi mencionado anteriormente. Poderia até ser criado um género de imperativo moral e universal, ou seja, um fundamento para que os indivíduos se comportassem de forma eticamente aceitável. Assim, todos os participantes desta realidade (composta pelas suas variadíssimas camadas) acabariam por ter consciência de que as suas escolhas e atitudes seriam punidas ou recompensadas por uma entidade superior e, consequentemente, acabaríamos por nos deparar com um sentido na nossa existência. A meu ver, mesmo que cheguemos à conclusão de que vivemos numa realidade simulada, isso não retira sentido à nossa existência. Mesmo que este cenário seja verdadeiro, não parece retirar ao ser humano a importância das suas ações, pelo contrário, poderia até valorizá-las.
Com a terceira opção proposta por Bostrom, acabamos por possuir uma maior abertura para outros tipos de cenários, como por exemplo, a possibilidade da nossa consciência (pós-morte) ser simplesmente transferida para outra simulação. Este procedimento seria algo semelhante ao sistema de mind uploading. Assim, acabaríamos por compreender o que acontece ao ser humano após a cessação da sua existência mundana. Por outro lado, se o custo de realizar uma simulação onde existam camadas sobrepostas for alto demais, é um pouco óbvio que essa deverá ser cessada a partir do momento em que uma das civilizações dentro dela dê sinais de que está prestes a tornar-se pós-humana. Esta ideia é apresentada pelo filósofo no seguinte excerto:
‘’ Reality may thus contain many levels. Even if it is necessary for the hierarchy to bottom out at some stage – the metaphysical status of this claim is somewhat obscure – there may be room for a large number of levels of reality, and the number could be increasing over time. (One consideration that counts against the multi-level hypothesis is that the computational cost for the basement-level simulators would be very great. Simulating even a single posthuman civilization might be prohibitively expensive. If so, then we should expect our simulation to be terminated when we are about to become posthuman.)’’ BOSTROM (2003)
Supondo que a nossa civilização eventualmente será capaz de executar simulações deste cariz, existem duas possibilidades: a de cessarmos a nossa própria existência ao atingir esse patamar, ou a de vivermos o resto da nossa vida com a noção de que estamos a vivenciar uma falsidade. No entanto, penso que não exista necessidade de cair na insanidade caso a proposição 3) seja verídica. Ao existir a hipótese de estarmos a viver numa simulação, isso acaba por reduzir ou aumentar a possibilidade de extinção, uma vez que este fator depende das intenções dos nossos criadores. Se simulações estivessem a ser utilizadas para dar continuidade à raça humana, por motivos de um futuro caótico no qual não fossemos capazes de sobreviver, então este seria um cenário que indica a nossa própria preservação. Por outro lado, se as intenções dos nossos criadores não forem tão boas e nós estivermos meramente a ser utilizados como sujeitos de experiências, a probabilidade de sermos desconectados (e portanto extintos) a qualquer momento aumenta.
Por outro lado, as limitações computacionais poderiam tornar provável que a nossa simulação fosse cessada antes que fosse possível atingir um patamar pós-humano. A maior esperança, neste caso, seria que a possibilidade 2) mostrasse ser a hipótese verídica. Por outro lado, parece improvável que uma civilização avançada tenha a capacidade de executar simulações e simplesmente escolha não o fazer. Pois, não terão essas civilizações (já com maturidade tecnológica) a necessidade de aprender mais sobre o seu passado? Talvez. Mas estariam estas preocupadas em deixar-nos existir?
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