Delírio de amor, Solange Damião

Texto de Solange Damião. Revisão de Sebastião N. Viana.


Este amor é casto. No íntimo dele está uma brasa
e a imortalidade das almas.
Este amor é posto à prova, com suas
candeias e sendas luminosas.
A luminosidade que é existente nos anseios da liberdade.
– nas asas do pássaro.

Este amor é a primavera dos meus dias,
a flor do meu deserto.
O poço artesiano onde moro
e mergulho os cabelos, e faleço.
Local onde renasço interminavelmente.
– Porque como musa invocou-me
em seus versos livres e transformou-me
numa rosa dos ventos. – era um barco à deriva,
poema sem escala, viagem perdida. Hoje sou segredo, sagrado
no espanto dos fatos.

E, na sombra de uma substância macerada como uma lenha
pelo machado sou um forno por onde
vaza a existência antiquíssima pelas sinuosidades
embotadas. Sou aguardada na quentura
dos vértices. Chamam-me: Aldeia.
E subitamente eu sou uma aldeia afogueada
pelas faíscas que gemem no silêncio.
– Porque me devoram até se consumirem inteiras,
no lugar celestial.

Este amor engaiolou-me de porta aberta.
Enveredo no seu tempo com a vida,
Inflo-lhe o universo com o tato numa valsa modificada,
para que ele jorre palavras.
Sua face revela que serei sol eterno.
Sou perpétua, querida, afim.
Devasto tudo o que é orvalhado, e cálido, e fértil,
e assombrosamente arrebatador.
– Sou uma intensa desordem de astro e chão.

Assim, arrebato-lhe para uma insensatez absoluta e sublime, queimo
pétala a pétala toda a seiva íntima,
e a existência que se tateia de uma filtrada
lembrança.

Colho-me então com a sua luminária.
Medito, consumo-me, alimento-me
desse abafado mistério.
Apodero-me do delírio, e faleço, e renasço.
Em seguida, elevo-me com as pálpebras imensas
e ardo a morada, trovejo escancaradamente os arbustos,
mato o céu com o seu segredo arrebatado.
E assim sou perpétua.