Editorial da Edição Nº 85

Texto de Tomás Vicente Ferreira. Revisão de João N. S. Almeida.

Eis-nos, enfim, chegados ao término do ano lectivo! Antes de irmos todos – ou melhor, quase todos – de férias, Os Fazedores de Letras têm a alegria de vir hoje trazer a público a edição nº 85. Esta chega mais de quatro meses após a última; este foi um longo intervalo de tempo em que não cessámos de trabalhar na montagem desta edição mas em que, igualmente, fomos organizando muitas outras iniciativas. Não faltou, por isso, trabalho à equipa do jornal, e queremos desde já agradecer a todos que para isso contribuíram. Neste editorial, quero começar por recapitular um pouco do nosso trabalho deste semestre, desde Fevereiro, bem como falar um pouco sobre algumas conversas positivas que surgiram a propósito do nosso trabalho. Em terceiro lugar, não posso deixar de dizer algumas palavras acerca de uma lei recente que visa os meios de comunicação pública – refiro-me, claro, à equivocamente chamada “Carta Portuguesa dos Direitos Humanos na Era Digital”. Por último, quero falar um pouco da edição que agora apresentamos e de alguns planos que temos para o futuro próximo.

Comecemos pelo primeiro ponto. A edição nº 84 foi publicada a 8 de Fevereiro último e, findo o trabalho com ela relacionado, retomámos com entusiasmo a nossa série de conversas online públicas, bem como de entrevistas tidas à porta fechada e depois divulgadas nas nossas plataformas. Quanto às entrevistas, a primeira foi a que Joana Rebocho e João N. S. Almeida fizeram ao poeta e artista plástico André Tecedeiro, realizada a 13 de Fevereiro e publicada poucos dias depois. Por sua vez, no início de Abril entrevistámos a Prof.ª Ana Isabel Soares (U. do Algarve) a propósito do seu trabalho como tradutora da epopeia finlandesa Kalevala. Mais tarde, a 11 de Junho, a Prof.ª Ana Isabel Soares juntou-se a nós para uma conversa muito agradável sobre estética, desporto, multidões e presença com o Prof. Hans Ulrich Gumbrecht (U. de Stanford e FLUL). Antes disso, a 30 de Maio, o nosso colega Luís G. Rodrigues entrevistou o Prof. Fernando Brissos acerca do papel dos média em tempos de pandemia. Quanto às conversas online em directo, começámos por organizar uma mesa-redonda/debate a propósito do Dia da Mulher – que nós transformámos em “Mês da Mulher”, tendo publicado conteúdos relacionados com o tema entre inícios de Março e meados de Abril –, organizado pelos nossos colegas Ana Sofia Souto, Joana Rebocho, Miguel Ribeiro e João N. S. Almeida e em que tivemos a honra de receber as convidadas Raquel Serdoura e Mariana Gomes para uma muito estimulante conversa a quatro. Seguiu-se-lhe, a 30 de Abril, a conversa sobre Mécia e Jorge de Sena, em que foram convidados e oradores a Prof.ª Isabel de Sena e o Prof. António M. Feijó – só tendo nós podido publicar, infelizmente, os trechos em que falou o Prof. Feijó. Pouco depois, a 6 de Maio, foi a vez da conversa sobre Vergílio Ferreira nos 25 anos da sua morte (1996), organizado também pela nossa colega da FCSH Ana Sofia Souto (a qual, infelizmente, por razões profissionais, teve de cessar a sua colaboração connosco), em que fomos anfitriões da Prof.ª Isabel Cristina Rodrigues (U. de Aveiro) e do Prof. Manuel Cândido Pimentel (UCP). Realizámos, ainda, dois debates, um sobre liberdade de expressão (24 de Abril) e outro sobre práticas e identidades sexuais (24 de Maio) – ao que podíamos acrescentar a sessão de esclarecimentos sobre o nosso processo de revisões havida a 5 de Abril e a sessão comemorativa da publicação da edição nº 84, a 24 de Fevereiro. Publicámos, ainda, o já mencionado dossier temático sobre o Dia da Mulher e vários artigos dispersos, bem como traduções dos nossos editoriais para russo e inglês. Aproveito, também, para voltar a agradecer ao Bernardo André, que tem feito um excelente trabalho enquanto designer do jornal, nomeadamente desenhando os cartazes para estes eventos. Todos estes eventos e iniciativas foram, no geral, bem-sucedidos e pretendemos continuar esta série. Contamos ainda realizar, até ao fim de Julho, pelo menos dois outros eventos, organizados respectivamente pelos colegas João N. S. Almeida e Lourenço Duarte (mas, sobre isso, falarei mais à frente). Resta-me salientar três novidades muito relevantes e, creio, bem-vindas: a primeira é o facto de, há algumas semanas atrás, termos inaugurado a nossa presença em várias plataformas de podcasts com os registos áudio dos nossos eventos (está tudo aqui); a segunda é o organograma de entidades oficiais e civis da FLUL, compilado pela Márcia Marto e pelo João N. S. Almeida, uma lista mais ou menos inédita, muito oportuna e útil para todos os alunos e principalmente para novos estudantes; e a terceira é que em breve começaremos a abrir a maior parte das nossas reuniões de redacção — que decorrem com periodicidade quinzenal — ao público em geral, pois não temos segredos para ninguém e cremos que essa abertura pode levar a uma profusão de ideias de onde possam sair bons resultados.

Falemos agora um pouco acerca de algumas muito curiosas, e outras muito positivas, reacções de grande parte do público que o nosso trabalho tem gerado ao longo dos últimos meses. A nossa abordagem ao tema do Dia da Mulher, num espirito universalista e objectivo, recebeu tanto uma série de submissões muito sólidas e apaixonantes, sob a forma de vários textos críticos e líricos, assim como obras de arte, mas também algumas reacções mais escorregadias, provavelmente devido à artificial polemicidade com que o tópico é por vezes vivido hoje em dia. O critério exigente das nossas revisões aos textos, e a expressão franca com que dialogámos com os autores e com os leitores, suscitaram uma inesperada onda de protestos online (quase exclusivamente no Twitter) sob dois pretextos equivocados: um, que alguém por ser mulher teria imediatamente, devido a esse estatuto, direito a escrever qualquer coisa, mesmo que má, sobre o tema, sem ser por isso criticada; e segundo, a assunção do princípio geral, que pressupõe o primeiro ponto, ou seja, que a posição experiencial de uma pessoa sobre uma coisa a qualifica necessariamente para falar melhor sobre essa coisa. Este é um ponto importante, pois obviamente que as coisas nem sempre se passam assim, e que merecerá um debate futuro. A histeria on-line, alicerçada nestes princípios anteriormente mencionados, chegou ao ponto de apresentarem em público uma nossa revisão a um texto como se fosse algo de que devêssemos ter vergonha, o que parece estar a tornar-se prática corrente de uma determinada camada da população estudantil: lembremo-nos que, em Outubro passado, houve quem achasse por bem divulgar correspondência do Director da Faculdade, na sequência do que vários canais de televisão, incitados por certos alunos, fizeram reportagens mentirosas e descabidas sobre pretensos factos da vida comunitária na FLUL. Se tais acções não têm tido consequências legais, é simplesmente por os visados por elas terem um muito maior grau de decência do que quem as comete, mas evidentemente desaconselhamos vivamente, por uma questão de decência, mas tendo em atenção também as provisões legais em vigor, a que se faça tal coisa. Mas essa não é, aqui, a questão principal para nós. Na sessão de esclarecimento que realizámos a 5 de Abril, em que nenhuma pergunta ficou por responder, e na sequência de conversas com várias pessoas, ficou amplamente esclarecido que as acusações inflamadas que nos digiram eram absolutamente falsas e que qualquer texto que nos é submetido nos merece o mesmo processo de revisão exigente e dialogante a que sujeitamos qualquer um, seja aluno, professor, político, homem, mulher, nacional, estrangeiro, etc., e ninguém tem nenhum estatuto especial que o escuse disso. No entanto, isto levanta várias questões. Uma dessas questões tem a ver com o aparente primado da subjectividade para uma considerável percentagem do público. Ora, acontece que a subjectividade não é critério de verdade. Não é porque eu penso uma coisa – ou a expresso – que essa coisa é verdadeira. Do mesmo modo, não é porque eu sinto alguma coisa – por exemplo, ofensa – que esse sentimento é justificado. Da mesma forma, não é por uma pessoa ser uma determinada coisa – suponhamos, mulher, chinês ou compositor – que tem um acesso privilegiado ao conteúdo do que é ou faz. Podemos facilmente imaginar um homem – por exemplo, um psicólogo – a dissertar com mais acerto sobre pessoas particulares ou pessoas no geral sem estar na pele dessas mesmas pessoas. Assim, também podemos facilmente imaginar um inglês que perceba melhor Portugal do que a maioria dos portugueses ou um chileno que tenha insights particularmente finos sobre a China que escapariam a muitos chineses. Da mesma forma, uma pessoa pode ser até bom a fazer música e, como um bom inspirado, não saber muito bem explicar – ou sequer ser particularmente consciente de – aquilo que faz, como famosamente afirmou Platão a propósito dos poetas, o qual também alertou para os perigos de uma vida pública baseada nas emoções e na subjectividade.

A conversa a que me referi no parágrafo acima teve, como geralmente as conversas têm, efeitos muito positivos. O primeiro foi o de reiterar para nós o facto de que, quando conversam pormenorizadamente sobre aparentes conflitos, as pessoas geralmente se entenderem e diluírem os conflitos. Ou seja, para ecoar a ONU e diversos líderes religiosos e políticos nossos conhecidos, o diálogo propicia a paz. O segundo foi o ter servido para divulgar mais o nosso trabalho e, sobretudo, ter-nos permitido interagir directamente com o público. Por fim, um terceiro efeito positivo, comum aliás a todas estas conversas, foi o ter servido de ocasião para que um número considerável de pessoas nos manifestasse a sua solidariedade e apoio. Algumas dessas pessoas já eram nossas conhecidas, com outras contactámos pela primeira vez e algumas delas começaram ou começarão a colaborar até connosco.

If memory serves, a reacção grupal adversa que enfrentámos a seguir gerou-se a propósito da nossa iniciativa de organizar um debate sobre liberdade de expressão, o qual teve lugar a 24 de Abril, véspera do dia em que se comemora a Revolução dos Cravos. O debate em si foi extremamente cordial e frutífero, mas – mais uma vez no Twitter, rede social que parece ser a câmara de eco dos impulsos menos saudáveis da sociedade e em que se nota uma acerba polarização – nas semanas que o antecederam fomos sendo confrontados com algumas reacções hostis. É de estranhar que, sendo a da FLUL uma comunidade maioritariamente de centro e de esquerda, esta se mostre tão avessa à ideia de liberdade de expressão, a mesma liberdade de expressão que, em muitos casos, é o garante de direitos cívicos de que podem beneficiar. É de estranha, também, que estudantes de letras tresleiam uma passagem de Karl Popper e a transformem num meme de internet que descreve exactamente o contrário daquilo que o autor de facto disse. É ainda de estranhar, igualmente, que, hoje em dia, a liberdade de expressão seja tida como “coisa de direita” e que uma esquerda que se diz democrática a encare com tanta suspeição e até com hostilidade declarada. Repentinamente, há uma série de taboos e coisas que não se podem questionar. Ora, naturalmente, isso não é nem verdadeiro nem saudável e Os Fazedores de Letras não vão alinhar nisso. Estamos aqui como órgão de comunicação consciente de descender e beneficiar da tradição liberal do pensamento livre, da liberdade de consciência e de expressão e não aceitamos nem dogmas nem taboos, nem restrições da liberdade inalienável que é indispensável à justiça e à verdade. Lembrem-se todos aqueles que prezam a diferença, o diálogo e a tolerância – como nós prezamos – que nenhuma destas coisas existe sem liberdade individual e colectiva para pensar e ser. Diferença sem liberdade torna-se uma nova “mesmidade” [sameness], uma nova ditadura, um novo padrão opressor. Diálogo sem diferença não é diálogo, é coro ou monólogo. Tolerância sem diversidade não é tolerância, porque não há o que tolerar, uma vez que tudo é igual às verdades subjectivas do sujeito que “tolera”. Notamos, assim, com preocupação, laivos de ortodoxia autoritária e totalitária no seio de uma comunidade onde devia reinar o debate aberto e asseveramos que é nossa intenção continuar a combater essa tendência.

O nosso mais recente debate, sobre “práticas e identidades sexuais”, gerou, igualmente, algumas saudáveis reacções – uma vez mais, na já mencionada rede social e, desta vez, também no Instagram. A maior parte dessa agitação, tanto quanto pudemos perceber, advém de uma espécie de iliberalismo mascarado de liberalismo e de alguns dos dogmas da pós-modernidade. Vários destes dogmas têm a ver com ideologia de género e com debates sobre identidade, o sujeito e liberdade sexual (ou aquilo que cada um entende como liberdade sexual). Vamos, aqui, falar apenas d dois pontos que foram levantados: a de que discutir as terapias de conversão sexual e as mudanças de sexo implica uma pré-posição quanto às mesmas; a segunda, a de que determinadas posições sobre esses temas podem ser lidas como transfóbicas. Deixem-me começar pela primeira. Quero sublinhar veementemente que as terapias de conversão sexual — que podem tomar várias formas, para quem não sabe — são, em geral, nas palavras de um amigo meu inglês,  “a terrible idea, and they don’t work”. Mas o que questionámos foi se deviam ser objecto de uma proibição legal, contrastando-as com o caso análogo das operações de mudança de sexo, estas últimas envolvendo procedimentos dolorosos e operações múltiplas ao longo de vários anos, conforme explicita o artigo do Público que partilhámos nas nossas redes sociais. Isto permite-me abordar o ponto seguinte, a facilidade com que nas redes sociais e, em muito menor grau, numa parte no discurso público, se acusa alguém de ser “transfóbico”. Ora isso, frequentemente e decerto no nosso caso, não é de todo verdade. “Fobia” quer dizer 1) medo de alguma coisa; 2) ódio a alguma coisa; ou seja, “transfobia” significa propriamente “ter medo de ou ódio a pessoas trans”. É óbvio e deve ser óbvio para qualquer estudante de humanidades que se preze que levantar as questões acima descritas quanto às terapias referidas nada tem a ver com “ter medo de ou ódio a” o que quer que seja, a não ser que a palavra seja mal empregue e o seu significado distorcido para poder ser atirada à cara de qualquer opositor político, ideológico ou filosófico. Do mesmo modo, questionar, de modo comparatista, a pertinência ou a legitimidade das complexas e dolorosas operações de mudança de sexo, que não servem nenhum propósito clínico, não deriva de nenhuma fobia porque não deriva nem de medo nem de ódio a quem quer que seja. E proibir que se discutam estas e outras coisas aberta e civilizadamente apenas evidencia a maleita social de intolerância e autoritarismo que diagnosticámos no parágrafo acima.

Todas estas conversas levantadas pelo nosso trabalho acabaram por se aglomerar em volta de um ponto que cremos ser muito importante e que servirá de tema, seguramente, a debates futuros e porventura a uma edição dedicada: aquilo que queremos dizer quando nos referimos à “ciência” e em que medida é que interpretação já não é bem ciência. Para nós é muito satisfatório que todas as conversas sadias que se levantaram tivessem posto esta questão a nu, pois é onde mais discordâncias foram encontradas. Um outro ponto muito importante que ressaltou das nossas interacções com os leitores nos últimos tempos, e que também seguramente dará origem a mais produções ensaísticas e um debate mais aprofundado, é a relação da religião com as humanidades: A estranheza que muitos estudantes sentem ao ver tópicos relacionados com a religião inseridos no estudo das artes e das humanidades e a ainda maior estranheza que sentem quando descobrem com muito do que lá se estuda advém de questões religiosas mais antigas. Em suma, todas esta questões, advindas não só do nosso trabalho em particular como editores mas também e principalmente das contribuições de todos os colegas, seja em forma de texto seja das participações nos debates e nas redes sociais, são imensamente positivas enquanto matéria de discussão. Isto porque põem a descoberto áreas dúbias do pensamento de todos nós, enquanto estudantes de humanidades, e porque ajudam a clarificar reiteradamente mal-entendidos e engodos filosóficos.

Antes de passarmos a uma breve vista panorâmica da presente edição, quero falar de um assunto que não podemos de todo contornar. Trata-se da publicação da Lei 27 de 17 de Maio de 2021, equivocamente chamada “Carta Portuguesa dos Direitos Humanos na Era Digital”. Já se fizeram ouvir reservas e críticas de uma grande panóplia de figuras de relevo na sociedade e na imprensa, como por exemplo o provedor do leitor do Público, José Manuel Barata-Feyo, o ex-ministro e ex-deputado António Barreto, e o ex-deputado europeu e bibliófilo José Pacheco Pereira. Quanto a nós, tendo lido o texto da lei, achamos inadmissível, num estado dito democrático, que o Estado tome para si a função de definir o que é ou não desinformação e a que informação o público tem acesso, que se proponha estabelecer um regime de delação e estruturas de censura de informação e de penalização legal (cf., para todos estes pontos, o art. 6º, nos. 1-2 e 5-6). Ora vejamos. Diz o nº 2 do referido artigo:

Considera-se desinformação toda a narrativa comprovadamente falsa ou enganadora criada, apresentada e divulgada para obter vantagens económicas ou para enganar deliberadamente o público, e que seja suscetível de causar um prejuízo público, nomeadamente ameaça aos processos políticos democráticos, aos processos de elaboração de políticas públicas e a bens públicos.

Ou seja, o Governo está a proteger-se a si mesmo de informação que o possa lesar ou prejudicar (ou apear do poder), não a proteger os cidadãos. E, mesmo que estivesse, não é função dos governos democráticos limitar o acesso voluntário do público seja a que informação for. Quanto ao regime de delação, veja-se o nº 5:

Todos têm o direito de apresentar e ver apreciadas pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social queixas contra as entidades que pratiquem os atos previstos no presente artigo, sendo aplicáveis os meios de ação referidos no artigo 21.º e o disposto na Lei nº 53/2005, de 8 de novembro, relativamente aos procedimentos de queixa e deliberação e ao regime sancionatório.

Quanto a estruturas de censura e validação, vejamos o nº 6:

O Estado apoia a criação de estruturas de verificação de factos por órgãos de comunicação social devidamente registados e incentiva a atribuição de selos de qualidade por entidades fidedignas dotados do estatuto de utilidade pública.

Tudo isto, como um dos autores acima indicados salienta, não é substancialmente diferente das leis de censura da Ditadura Militar ou do Estado Novo. É sobremaneira preocupante que qualquer governo democrático se sinta tão seguro ao ponto de poder começar a restringir passo a passo as liberdades públicas do seu eleitorado. É igualmente preocupante a mansidão com que esta lei está a ser acolhida e que uma larga fatia da população não esteja seriamente preocupada. Sintoma, quiçá, da pouca profundidade dos valores verdadeiramente democráticos em Portugal, esta lei é porventura o primeiro toque fúnebre dos sinos da nossa democracia. Os Fazedores de Letras, bem entendido, irão continuar a protestar contra esta e qualquer outra veleidade anti-democrática.

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Por fim, olharemos agora para a nossa presente edição, nº 85. Começo por agradecer ao Lourenço Duarte, ao João N. S. Almeida e ao Luís G. Rodrigues pelo muito que contribuíram para que esta edição chegasse a bom porto. Chamo, também, a atenção para a capa da edição, da autoria do Tiago Guerreiro, digna sucessora das nossas últimas duas capas. Uma palavra pública de agradecimento aos senhores deputados Sara Madruga da Costa (PSD) e Jacinto Serrão (PS), que muito generosamente aceitaram contribuir para esta edição com crónicas sobre o 25 de Abril, as quais convido todos a lerem. Ainda na nossa secção de crónicas, realço os textos do Vítor Mendonça, do Tomás Gorjão e da Mariana Almeida. Na secção de ensaios, recomendo com particular entusiasmo os ensaios de Fátima Pinheiro, Tiago Ramos e João Rochate, sem demérito para os restantes, também eles muito bons. Quanto às recensões, saliento a do Prof. Frei Isidro Lamelas, OFM, a A Religião Gnóstica de Hans Jonas, aqui numa tradução da nossa colega Ana Pereirinha (Imprensa da Universidade de Lisboa, 2019). Por último, convido-vos a ler a nossa bela secção de poesia e as traduções de James Dias de textos de Larkin e Dickinson.

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Apenas uma última nota: por razões várias, relacionadas principalmente com o atarefado final de semestre a que todos nos dedicámos nos últimos tempos, não conseguimos incluir nesta edição todo o material que tínhamos planeado. Assim, publicaremos, até ao fim de Julho, um suplemento a esta edição. A edição nº 86 está prevista para Outubro, mas continuaremos activos durante o Verão, publicando artigos isolados, entrevistas, e organizando tertúlias, debates, propondo ensaios, recensões, e dossiers temáticos. Todos os alunos da Faculdade de Letras, e não só, são bem-vindos a colaborar connosco: fazendo-nos chegar as vossas submissões, pedindo-nos ideias, dando-nos ideias, participando mais de perto na vida da redação, avaliando e revendo textos, marcando presença nas nossas reuniões, etc.

Desejo a toda a comunidade académica e ao público em geral umas boas férias de Verão.

Com os melhores cumprimentos,

Tomás Vicente Ferreira (Director)

Em nome da Equipa d’ Os Fazedores de Letras.