Texto de Joana Rosado.
Vim de debaixo da terra. Entro no chão verde e reluzente, com as sombras esticadas a rasgá-lo; largo a minha carga e caminho devagar, com os olhos no céu e o céu no meu respirar. As árvores também. Os troncos, escuros, curvos, entrelaçados, e as folhas a rodar, umas vivas, outras douradas; respiro tudo. Sinto as nuvens na minha pele. Passo por entre as gotas, pequeninas, que me sussurram ao ouvido – cantam todos a mesma melodia. Oiço-a quando os sinto aqui, comigo, e eu com eles. Somos um.
Abro os olhos, fecho-os outra vez. Absorvo cada parte à medida que avanço, com todas as formas e feitios que jamais se pôde ter.
Apesar do céu, não me separo do chão e continuo a saber falar – sei que sim, mas não o faço. Confio em tudo porque aqui tudo me acrescenta, nada me tira nada. Sou um lago quase cheio, sem saber o quanto consigo encher – e tão bom que é não procurar a resposta. Só ser. Como os patos imersos na água, mesmo à beirinha, a limpar as penas brilhantes com o bico comprido. Uns mergulham a cabeça e fazem a água escorregar pelas costas. Outros ficam em pé a observar. Depois vão para terra e continuam. Ou como os pontinhos de luz que voam todos juntos e só se veem quando o sol aparece. Estão em casa. E as formigas, aqui perto de mim. E os amarelos dos troncos, que crescem sem se ver. Estou em casa.